Tiago Massoni

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Associate Professor in Computer Science

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Retrospectiva 2020

Data: December 30, 2020 Palavras chave: Redes sociais, Retrospectiva, Tecnologia

Pesquisa

Bom dia ouvintes de CBN,

Última semana do ano, momento de retrospectivas. Será que alguém quer se lembrar desse ano tão penoso, tão estranho? Acho que do ponto de vista dessa coluna, torna-se necessária uma revisão. Afinal, a tecnologia entranhou-se em nossas vidas, acelerando rotinas e processos. Todo mundo teve que se adaptar pelo menos um pouquinho. Mesmo assim, acho que saímos melhores do que entramos, e a atividade econômica só não caiu mais ainda por causa da tecnologia. Fico imaginando uma pandemia como esta nos anos oitenta, sem internet ou smartphone, com pouquíssimos e caros computadores pessoais…

Primeiro de tudo, 2020 foi o ano das telas. Vai trabalhar? Tela. Vai vender ou comprar? Tela. Vai se distrair? Mais tela. Talvez nossa vida tenha finalmente virado um filme, já que se passou toda dentro das telas.

O uso de redes sociais disparou, primeiro para que as pessoas, ora separadas, se comunicassem, ou então para a busca incessante por notícias – as Big Techs, donas das redes sociais mais conhecidas, nunca faturaram tanto. Assim, elas entraram no foco dos concorrentes de mídia e dos governos, como por exemplo, na neutralidade que adotam em relação a notícias falsas ou disseminação de discurso de ódio. Google e Facebook terminam o ano ameaçados por acusações de monopólio na justiça que podem resultar na divisão dessas companhias, ou na mudança de suas práticas.

Talvez a pandemia tenha sido o período ideal para que as duas empresas líderes em consoles de videogame, Sony e Microsoft, escolhessem 2020 para lançar a nova geração. O PS5 e o Xbox Series S/X foram lançados com ótimas vendas e preços até acessíveis, se comparados com os lançamentos das gerações anteriores. Pois é, tem muita gente jogando videogame em casa.

E também tem muita gente assistindo a serviços de streaming pela Internet – enquanto não estamos olhando o instagram ou o WhatsApp, estamos assistindo Netflix ou PrimeVideo ou DisneyPlus. Muitos serviços ficaram mais baratos, e novos foram lançados, para aproveitar a avalanche de novos clientes ávidos por distração – afinal, ficamos sem a opção dos cinemas, teatros, shows de música e outros eventos.

Junto com a cultura e o turismo, o comércio está entre os mais prejudicados. Ainda assim, os desafios impostos às transações comerciais podem ter acelerado a tendência dos negócios de base puramente digital. Não estou falando apenas das grandes empresas de comércio eletrônico, que já vinham faturando alto antes da pandemia, mas também dos pequenos negócios, que hoje já se estabilizam com vendas pelo Instagram e Whatsapp e entregas cada vez mais ágeis. É a transformação digital, antes um conceito meio abstrato, se materializando diante de nós do dia pra noite. Claro, isso tende a diminuir a compra por impulso nas visitas às lojas, mas pode representar uma redistribuição no poder de negociação e vendas entre fornecedores, lojistas e consumidores, baseada em um novo tipo de relacionamento, mais transparente e confiável.

E, pra que essa confiabilidade fosse concretizada, os sistemas de pagamento tiveram que evoluir. Primeiro, pra evitar colocar a mão nos teclados de senha das lojas, muito mais gente usou o pagamento por contato, através de cartão ou smartphone. 2020 foi o ano do Pix, lançado pelo Banco Central, que exige de uma transferência de altos valores não mais que alguns segundos e nenhuma taxa das pessoas físicas. Em breve, teremos o Pix pra pagamentos, que promete ter efeito duradouro às transações de pagamento de forma geral. Além disso, as Fintechs – os bancos digitais sem agência e com menos taxas que os bancos convencionais – se consolidaram no mercado. Quem também teve que se virar muito rápido para evoluir em pagamentos eletrônicos foi o Governo Federal, através da Caixa, com o pagamento do auxílio emergencial. Pensa comigo, conseguimos pagar auxílios para 60 milhões de pessoas, através de uma poupança digital, o que nos leva a estimar um crescimento de 73% na digitalização financeira do Brasil. Essas pessoas poderão no futuro agilizar recebimento de outros auxílios, como bolsa família ou seguro desemprego, de forma mais segura, com menos medo da tecnologia – se deu certo uma vez, as pessoas tendem a confiar mais.

E o trabalho? Com internet e um computador (ou smartphone), trabalhadores de escritórios do mundo todo tiveram de se aclimatar ao home-office, saída encontrada pelas empresas para manter suas atividades e preservar a saúde dos funcionários. Há um misto de satisfação e irritação com essa situação. Por um lado, empresas podem contratar mais pessoas especializadas, que não moram na mesma cidade do escritório, e há relatos de maior produtividade, pois não se perde tempo com conversas ou com o deslocamento até o local de trabalho. Por outro lado, trabalhar em casa traz outros custos, pois é muito difícil se concentrar em um ambiente com família, especialmente filhos (que estiveram fora da escola, ao mesmo tempo). É fácil se perder nos limites entre casa e trabalho, quase que obrigando o empregado a estar disponível em qualquer horário. Além de tudo, reuniões virtuais e conversas por mensagens cansam, ao contrário do que possa parecer quando visualizamos alguém que está sentado no mesmo lugar o dia todo.

Bom, eu também, um professor universitário que realiza pesquisas, fui colhido pelo tsunami que me obrigou a mover, de uma hora pra outra, todas as minhas aulas e trabalho de pesquisa para o ambiente virtual. O setor educacional foi obrigado a talvez a maior das adaptações, para que pudesse simplesmente continuar existindo. O custo para quem estuda é muito alto; enquanto obriga-se a ter o mesmo desempenho em um ambiente menos propício para o estudo – em geral, nossa própria casa – perde-se a possibilidade da interação entre colegas e professores que complementa o processo de aprendizado. Estudantes precisam estar muito motivados pra avançar em um contexto como esse, e ainda estamos aprendendo com o processo. O problema é enorme porque a educação virtual exige muito mais recursos tecnológicos, o que exclui boa parte dos jovens estudantes brasileiros e de outros países tão pobres como o nosso. Ainda há muito o que fazer.

Na minha humilde opinião, por mais que a tecnologia tenha sido tão importante, sua utilização precisa ser combinada com o contato humano. Eu, como a grande maioria de vocês, preciso equilibrar a vivência no virtual com a interação social real, pra ser produtivo; consumo excessivo de tecnologia traz efeitos adversos. Por isso me despeço na esperança de termos um 2021 menos tecnológico e mais humano, com a imunização que precisamos pra voltar a estar próximos.

Um abraço e até o ano que vem.