Tiago Massoni

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Associate Professor in Computer Science

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Resumo A demanda por profissionais de tecnologia, combinada à vocação da região como formadora de recursos humanos na área, tem dado oportunidades para paraibanos irem trabalhar para grandes empresas que fornecem as soluções mais importantes do mundo digital. O que faz de Campina Grande um polo formador de profissionais de tecnologia da informação?

Bom dia ouvintes da CBN,

Depois de três ou quatro anos, através de várias noites mal-dormidas trabalhando em projetos solicitados pelos seus professores, uma jovem consegue um diploma de curso superior em ciência da computação, ou telemática, ou análise de sistemas, ou engenharia elétrica. Por seus conhecimentos em inglês forjado nas leituras obrigatórias da faculdade, consegue preparar um currículo ou um perfil no LinkedLin, que pode ser acessado por empresas nos EUA ou na Europa, que quase sempre estão necessitadas de profissionais para completar suas equipes, num mercado de demanda sempre crescente. Afinal, todo mundo precisa de tecnologia para fazer seus negócios funcionar nesse mundo de hoje. Essa jovem, aqui em Campina Grande mesmo, recebe chamadas de vídeo internacionais para uma entrevista de emprego. E ela então é contratada, talvez fazendo com que ela imigre para outro país, de clima frio mas economicamente desenvolvido, de onde ela pode desenvolver uma carreira internacional. Ou ainda ela pode continuar em Campina Grande, prestando seus serviços profissionais através de um computador conectado na internet, reunindo-se diariamente com seus colegas de trabalho em grupos de bate-papo e programas de trabalho cooperativo remoto.

Bom, essa se tornou uma estória típica de estudantes paraibanos, em Campina Grande e em outras cidades do estado. Uma estória que se repete dentro da economia global da informação em que vive o mundo hoje. O momento é único, provavelmente pela combinação de dois elementos essenciais: a demanda econômica por produtos e serviços digitais inovadores no mundo toda, superdimensionada pela crise desencadeada pela pandemia de COVID-19, e a massa crítica desenvolvida nos últimos vinte anos no ambiente universitário tecnológico da região de Campina, calcada na tradição de parcerias bem sucedidas entre entes públicos e privados.

Como resultado, vemos, talvez numa escala inédita, profissionais paraibanos em grandes empresas de tecnologia, protagonizando algumas dessas grandes mudanças que afetam tanta gente o tempo todo, pois qualquer novo aplicativo, ou nova funcionalidade no seu smartfone, ou novo avanço da inteligência artificial, tudo isso têm enorme impacto sobre nosso trabalho, nossas relações e o nosso dia-a-dia. Google, Meta, Spotify, Amazon…são essas algumas das empresas que hoje tem em suas fileiras paraibanos, ex-estudantes de Campina Grande, participando de projetos que afetam a vida de tantas pessoas.

Falando especificamente da UFCG, a história de seus cursos de tecnologia remonta à antiga Escola Politécnica de Campina Grande, criada em 1952. Em particular, a história do curso de ciência da computação tem sua origem no ano de 1968, quando foi instalado na Escola Politécnica de Campina Grande o primeiro computador em universidades do norte-nordeste do Brasil, um IBM 1130. Com a aquisição do primeiro computador e a vinda de engenheiros recém-formados do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), foram dadas as condições para a criação do Curso de Mestrado em Engenharia de Sistemas no Centro de Ciências e Tecnologia (CCT) da UFPB, em 1973. Nesse ambiente foi criado o Departamento de Sistemas e Computação (DSC), que é até hoje a unidade acadêmica da UFCG responsável pelo cursos de graduação, mestrado e doutorado em Ciência da Computação da UFCG. Sim, fazendo as contas, um departamento que completa 50 anos em 2023. O curso de graduação teve sua autorização de funcionamento emitida em 1976, e começou a funcionar no ano seguinte. Desde então, formou cerca de 1500 profissionais.

Em meados dos anos 2000, tem início o processo a que frequentemente se atribui a força atual de formação de profissionais da área. Formaram-se parcerias com entidades públicas e privadas, nacionais e internacionais, para o desenvolvimento de projetos que contaram com estudantes e professores formando equipes para lidar com problemas reais, dentro do contexto dessas entidades. Nesse sentido, alunas e alunos, enquanto cumprem os requisitos de formação nas disciplinas em cada semestre, trabalham, em parte do seu tempo, vivenciando a prática do dia-a-dia real, tratando de problemas que profissionais da área vivenciam diuturnamente em seus ambientes. A partir dessa experiência, o aprendizado dá um salto de qualidade, formando pessoas com habilidade técnicas, de cooperação e de comunicação, já muito alinhadas com o que mercado exige.

Esse é o mercado que precisa desesperadamente de profissionais. De acordo com o mais recente relatório da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), a área de Tecnologia da Informação (TI) no Brasil demandará cerca de 420 mil profissionais até 2024. Anualmente, o Brasil capacita 46 mil pessoas com perfil tecnológico aptas à área. Nessa projeção seriam necessários cerca de 70 mil profissionais ao ano para que as vagas sejam completamente ocupadas. Disso, duas necessidades urgentes aparecem: primeiro, as empresas terão que tornar as oportunidades mais atrativas para não ficarem para trás. Segundo, precisamos investir em educação tecnológica. Isso, ouvintes, só pras necessidades do mercado brasileiro.

Com o incentivo trazido pelas ferramentas de comunicação global, ficou muito mais fácil empresas de outros países recrutarem pessoas para suas equipes. Nossos desenvolvedores acabam seduzidos pelas propostas, cada vez mais frequentes, de gigantes de software fora do Brasil. Antes da pandemia, muitos dos nossos formados acabaram indo morar nos EUA ou na Europa através de seleções feitas aqui mesmo no Brasil — era fácil ver recrutadores estrangeiros visitando as melhores universidades, inclusa aí Campina Grande, e entrevistando alunos. Muitas fazem pré-contratos antes mesmo da formatura. Já na pandemia, vejam, o recrutamento internacional ficou ainda mais simples, porque trabalhar em uma equipe global de desenvolvimento de software requer apenas uma conexão de internet e um notebook, na maior parte das vezes. Aliás, a pandemia criou uma demanda tão grande que acabou superdimensionando as equipes. Nos últimos meses, várias dessas empresas demitiram milhares de profissionais. Ainda assim, tudo indica que esse é uma reorganização temporária, mesmo que necessária, a que a tendência é a normalização da demanda aos níveis previstos anteriormente.

Muitos dos alunos formandos e formados já trabalham em home-office para empresas de fora da Paraíba e estrangeiras. A preocupação é que isso acarreta uma fuga massiva de cérebros brasileiros. Saberemos, num futuro próximo, qual será o impacto disso para a economia do País. As empresas nacionais demonstram enorme dificuldade de pagar salários competitivos num contexto em que o dólar ou euro valem 5 vezes mais que nossa moeda.

Ainda assim, temos muito o que comemorar. Essas oportunidades em uma carreira estimulante, cheias de desafios interessantes, significam muito para os estudantes, trazendo enormes benefícios para sua família e sua comunidade, formando exemplos para outros de como a educação na área pode valer muito a pena. Esse é o momento que o investimento em educação na nossa região mostra-se valioso!

Um abraço e até a próxima.